A Democracia da Abolição

Um guia de estudos do livro de Angela Davis “A Democracia da Abolição: para além do império, das prisões e da tortura”

Resumo, parte 1

O Complexo Industrial-Prisional, Abolição das Prisões e a Democracia da Abolição

Da escravidão para as Leis de Jim Crow para as prisões

A opressão direcionada à pessoas negras nos Estados Unidos é um processo que evoluiu: se iniciou com a escravidão, passou pela segregação racial e as Leis de Jim Crow até chegar atualmente no complexo industrial-prisional. A escravidão, as leis de Jim Crow e o complexo industrial-prisional são instituições nas quais as punições consideradas bárbaras demais para a democracia são permitidas- permitidas pois seus alvos são pessoas negras e aquelas consideradas pouco demais para serem humanas ou cidadãs.

As prisões e o exército

O termo “complexo industrial-prisional” consiste em um sistema criado pela indústria- ou seja, as forças econômicas- e pelo governo que consiste em vigilância, policiamento e encarceramento. Tal termo foi criado propositalmente para fazer eco com outro, o “complexo industrial-militar”. De acordo com Davis, “as semelhanças básicas tornam-se evidentes” visto que "ambos os complexos obtêm lucro enquanto produzem meios de mutilar e matar seres humanos, e devorar recursos públicos”.

Tanto as prisões quanto o exército se tornaram partes importantes da economia dos Estados Unidos, e durante a Guerra do Vietnã, ao observar o papel importantíssimo que a produção militar teve na economia, essa relação ficou clara. Atualmente são as prisões que providenciam mão de obra barata que, entre outras coisas, fornece armamento.

O complexo industrial-prisional em ação

O complexo industrial-prisional perpetua o que Davis chama de violência ritualística 

“O sistema carcerário torna natural a violência decretada contra as minorias raciais ao institucionalizar uma lógica circular viciosa: os negros estão presos por que são criminosos; eles são criminosos por que são negros, e, se estão presos, é por que mereceram. As cadeias, sob mais de um aspecto, institucionalizaram os linchamentos da virada do século XX, quando Jim Crow estava em sua fase mais cruel e violenta.”

Davis afrima que o fato da maioria da população não questionar esse processo que rouba dos prisioneiros seu direito ao voto é um pensamento enraizado na escravidão que defende que certas pessoas não são cidadãs completas devido à certos fatores.

O complexo industrial-prisional também se apropria da riqueza social dos negros. Davis define riqueza social como recursos dos negros estadunidenses para manterem suas comunidades, como escolas igrejas, propriedades privadas etc. 

Uma vez que o negro estadunidense tenha estado na prisão, ele (ou ela) estará permanentemente rotulado. Esse estigma faz com que coisas que permitem uma reinserção na sociedade, como ter uma casa, conseguir um emprego, etc sejam retiradas deles.

O complexo industrial-prisional existe por causa de duas premissas amplamente difundidas na sociedade.

A primeira é chamada de contrato racial. O contrato racial “se refere à realidade sociopolítica-econômica-cultural na qual é mais vantajoso ser branco do que ser uma pessoa de cor, pois todas as normas são de fato normas brancas. Dentro do contrato racial, a punição social é aceita por ser aplicada principalmente aos negros.”

A segunda é que a sociedade acredita que a repressão excessiva- a ideia de que restrições e punições, nesse caso o aprisionamento, são partes “inevitáveis e desejáveis” da sociedade e uma “forma lógica e evidente para lidar com o crime”. Em sua luta pela democracia da abolição e pela abolição das prisões, Davis quer que nos questionemos se o aprisionamento é realmente a única maneira de se lidar com o crime. 

Davis faz duas críticas que questionam a necessidade das prisões.

A primeira é que não há correlação entre crime e prisão. Na realidade, o aumento da punição está relacionado com o aumento na vigilância racial. 

A segunda é que a prisão existe como uma solução punitiva para problemas sociais que podem e devem ser tratados por instituições sociais que possibilitem a conquista de vidas mais satisfatórias para as pessoas.  

Esses problemas sociais incluem, entre outros, a falta de moradia, a pobreza e a atual política de drogas. Com essa lógica, Davis argumenta que o Estado tem realizado uma farra de aprisionamento, na qual ele remove as “populações dispensáveis” da sociedade ao colocá-las na prisão.

Davis argumenta que enquanto as prisões trazem uma sensação de segurança contra o crime, elas também desviam a atenção contra ameaças que vêm da polícia, das forças armadas, de corporações gananciosas e parceiros íntimos- todas essas formas mais comuns de violência. 

Outras características importantes do complexo industrial-prisional incluem a tortura e a coerção sexual, que serão discutidos adiante. 


Bibliografia

DAVIS, Angela. A democracia da abolição: para além do império, das prisões e da tortura. Tradução: Arthur Neves Teixeira. 2. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2019.

Nós baseamos esse guia de estudos na versão digital do livro, por isso não listamos as páginas das citações.

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